Estranhou o título? Eu explico.
Com o passar dos anos e sem me tornar um velho ranzinza, percebo que aos poucos começo a perder o ‘filtro social’ que me mantinha mais reservado e tolerante diante de situações incômodas. Aos 76 anos, penso estar muito perto de ser acometido pela ‘Síndrome de Reimann’.
A denominação homenageia o Jose Alberto Reimann, um amigo muito especial que o tempo transformou em irmão.
Nos conhecemos em 1988 na memorável ‘Campanha dos 12 dias’ do ‘Coração Curitibano’ do Jaime Lerner, e nunca mais nos afastamos. Fomos parceiros na administração pública na Prefeitura e no Estado. Uma das pessoas mais capazes que conheci, depois de aposentado ele ainda colocou sua experiência a serviço do Tribunal de Contas. Infelizmente ele nos deixou em 20/02/2022.
O Reimann era tão leal e justo quanto intransigente com o incorreto, e fazia dessa qualidade um instrumento de humor – nem sempre, é verdade. Uma história dele inspirou o título desta coluna.
Já com 60 anos, chegando na fila prioritária de um supermercado o Reimann viu na sua frente uma mulher ainda jovem com uma criança de pelo menos 8 ou 9 anos no colo. Vendo a dificuldade dela para aguentar o peso e que era um recurso para usar a fila preferencial, ele não hesitou, e ‘no melhor estilo Reimann de ser’, cutucou o ombro dela e perguntou:
– “a Senhora leu o que está escrito na placa? A fila é para pessoas com crianças DE colo e não NO colo“.
Então: usuário de filas e vagas especiais há 16 anos, passei a nutrir profunda indignação com a placidez dos dirigentes de supermercados frente ao desrespeito aos Idosos. A vista grossa começa no abuso com relação às vagas dos estacionamentos e chega aos caixas preferenciais, funcionando como um estímulo à decantada ‘esperteza brasileira’, a tal ‘Lei de Gerson’ (aquele outro), que fala em ‘levar vantagem em tudo’. A postura omissa, que expõe o receio de perder clientes, atenta à dignidade e ao bem-estar dos idosos, e aí é impossível não lembrar do meu Amigo e imaginar o que ele faria depois dos 70.
Mesmo sendo uma questão cultural que nos tornou conhecidos pela prática do ‘jeitinho’, nós brasileiros não podemos continuar agindo como se isso fosse normal. No supermercado onde costumo ir, de vez em quando transmitem uma chamada, um lembrete patético em tom de ‘não nos levem a mal, desculpem incomodar’ e que menciona os caixas prioritários. Nunca vi um não-prioritário sequer dar uma olhadela para os velhinhos na fila; imaginar que alguém daria o lugar, convenhamos, seria esperar que “o diabo virasse Padre”.
Então, concluo com o seguinte aviso aos meus diletos Leitores:
– se souberem que este seu Amigo teve a ‘Síndrome de Reimann” e surtou no Assaí Atacadista da Av. Mal. Humberto de Alencar Castelo Branco em Curitiba, acreditem.
p.s.1: e o que me dizem dos ‘espertos’ que atuam em dupla? Enquanto um fica guardando lugar na fila, outro vai buscar ‘só mais algumas coisinhas’, e volta como se estivessem esperando o Armagedom?
p.s.2: Rosane, minha mulher, já disse que quando eu surtar não preciso telefonar, ela não vai me socorrer e passar vergonha.